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O jogo de Seu Luiz

Acho que faz mais de 4 meses que não posto aqui. Não que eu tenha abandonado o espaço, mas é que ando meio desiludido com alguns rumos tomados... Então, tô trabalhando pra tentar mudar isso.

O texto abaixo vai estar na edição de setembro da Revista Doentes por Futebol, publicação on line que participo desde janeiro.

Abraços aos que lerem. Ou não. Vai saber...
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O jogo de Seu Luiz - 18/08/2010

O canto era o da sorte. Do mesmo lugar, vi o São Paulo ser esmagado na primeira semifinal, em um daqueles 1x0 injustos, onde o goleiro adversário fora o melhor em campo. Faltavam três horas para o apito inicial, precisava comer alguma coisa pra ver se passava a ansiedade. Na volta do bar, meu lugar estava ocupado.

Sentei-me bem ao lado do intruso, que não demonstrava nenhum sinal de reação. O pensamento coerente dizia pra não ficar irritado com aquilo, pois éramos melhores e superstições são recursos dos mais fracos e descrentes no seu potencial. Mas eu queria o meu lugar. Escorado na pilastra, debaixo da placa do Tumelero, entre a linha da pequena e da grande área à esquerda do gol do Gigantinho.

Lá estavam duas pessoas. Que estavam ali com o mesmo propósito. Que não se conheciam. Mas compartilhavam de um mesmo sentimento: o amor pelo clube do coração.

E era óbvio que elas tinham que conversar entre si, afinal aqueles que adentravam ao gramado do Gigante da Beira-Rio eram o motivo por estarem ali. E foi justamente quando o General Bolívar, o libertador da América, pisou dentro do campo que trocamos as primeiras palavras:

- Cara, não te conheço, mas to muito nervoso... – Disse o senhor.
- Meu velho, não te preocupas. Hoje não tem como dar nada errado, olha pra esse Estádio! – argumentei, para, em seguida, cumprimenta-lo com a mão direita.

Quando os mexicanos abriram o placar, bem na nossa frente, seu Luiz me contava do seu trabalho na Polícia Civil no Partenon, um dos bairros com maior criminalidade de Porto Alegre. Ele já se apresentara contando que, para ver o jogo ao meu lado, tinha comprado ingresso para a torcida adversária. “Eu vi Falcão e os times da década de 1970, não poderia ficar de fora dessa final”, dizia ele, que não estivera no Gigante contra o São Paulo em 2006 por motivos de doença.

Debaixo de seu casaco cinza, a camisa vermelha ficava escondida dos mexicanos. Um abençoado policial que cuidava da divisória entre as torcidas foi solidário com seu drama, fazendo-o atravessar para o tão sonhado encontro com outros correligionários vermelhos.

No segundo tempo, seu Luiz era só nervosismo. “Sóbis ta mal, não segura a bola na frente. E o Nei é muito limitado, jogador só esforçado não adianta pra ser campeão!”. Quando o garoto de Erechim empatou o cotejo, seu Luiz celebrou beijando o escudo na camisa surrada, da época que Fabiano Cachaça entortava as defesas adversárias. Antes do segundo gol, ele chingara Leandro Damião.

- Esse não joga nada, nunca fez nada demais quando entrou em campo – opinou.
- Pois hoje é o dia que ele irá nos calar a boca e fazer o gol da vitória – falei sem pretensão.

Eis que, dois minutos depois, após arrancar do campo defensivo, o #21 invade a área e desempata a partida. A primeira reação do seu Luiz foi puxar o meu braço, antes da bola entrar calmamente no gol mexicano, para comemorar aos berros: “Tu disse, meu guri! Tu disse!”.

Ao final do jogo, quando Giuliano marcou seu sexto – e mais belo – gol na Libertadores, veio em nossa direção para comemorar o título colorado. Em meio a multidão enlouquecida ao ver o #11 de braços abertos no alambrado, seu Luiz não se conteve: virou para o pilar e chorou. Ao olhar para o lado, o vi no lugar onde eu deveria estar, senti-me recompensado. Nós, partes integrantes da nação alvi-rubra que marchara em direção ao Gigante durante todo o dia 18 de agosto, merecíamos aquele momento.

Talvez eu não veja mais o seu Luiz, assim como não vi o segundo gol do time de Guadalajara. Mas ambos guardaremos na memória o bicampeonato da América que vimos, lado a lado, atrás do gol do Gigantinho...

por Bruno Cassali.

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